Releases 29/09/2025 - 15:06

Dor no peito, palpitações e fadiga? Podem ser sintomas de Cardiomiopatia Hipertrófica


Dor no peito, palpitações e fadiga podem ser sintomas da cardiomiopatia hipertrófica (CMH), doença hereditária caracterizada pelo espessamento anormal das paredes do coração¹. "Se imaginarmos o coração em corte, ele se parece com um 'V'. Na doença, esse 'V' fica mais fechado, porque o músculo está mais espesso", explica o cardiologista da Sociedade Brasileira de Cardiologia Fabio Fernandes, de São Paulo. Em cerca de 60% a 70% dos casos, a origem é genética¹.

Embora não seja rara, atingindo de 1 a cada 200 a 500 pessoas, a CMH ainda passa despercebida, na maioria dos casos. Muitos pacientes não apresentam sintomas claros, ou manifestam sinais que parecem de outras doenças, o que atrasa o diagnóstico e o início do tratamento. Além disso, a doença ainda está associada a complicações graves como insuficiência cardíaca, arritmias, acidente vascular cerebral (AVC) e morte súbita, inclusive em atletas aparentemente saudáveis. É importante destacar, também, que o risco anual de morte súbita varia entre 0,5% e 1%, sendo maior em casos com histórico familiar, síncope inexplicada e taquicardia ventricular¹. "A morte súbita preocupa, e embora não seja a manifestação mais prevalente, é a mais impactante", destaca Fernandes.

Da descoberta até o tratamento

O caminho até a confirmação diagnóstica envolve avaliação clínica, histórico familiar e exames de imagem. Como resume Fernandes: "O médico começa pela ausculta do coração em busca de um sopro característico. Também investiga o histórico familiar, não apenas da doença, mas de morte súbita em parentes próximos. Depois, parte para exames de imagem, como o ecocardiograma e, se necessário, a ressonância cardíaca."

Mas os desafios, nessa etapa, estão longe de acabar. Uma pesquisa realizada pela Ipsos a pedido da Bristol Myers Squibb, em 2024, com 20 pacientes diagnosticados com CMH obstrutiva, forma mais prevalente da doença, revela que insegurança, ansiedade e isolamento social são experiências comuns4. Mais da metade dos entrevistados relatou sentir-se incompreendida por familiares, amigos ou colegas de trabalho, e muitos deles afirmaram já ter sido discriminados em ambientes profissionais. Os impactos econômicos também são frequentemente mencionados por uma parcela dos pacientes que relata redução da jornada ou afastamento temporário do trabalho, além de despesas adicionais com cuidados médicos.

"Eu na verdade ficava muito confuso. Porque eu tinha a ciência de que eu realmente estava cansado, eu realmente estava para desmaiar, mas as pessoas diziam que não, que aquilo era preguiça, que eu podia ir além. E aí foi quando eu tentei, numa certa feita, ir além, eu estava bem mal, tentei ir além e desmaiei”

- Relato de um dos pacientes entrevistados pela pesquisa (Ipsos, 2024)4

"Os pacientes chegam a ficar incapacitados em dias de crise, enfrentam preconceitos e têm a autoestima abalada", relata Marcos Bonato, Diretor de Relações Institucionais do Instituto Amor e Carinho. Já Maria Cecília Oliveira, diretora-presidente da Associação dos Familiares, Amigos e Pessoas com Doenças Graves, Raras e Deficiências (AFAG), completa: "O cansaço extremo é um dos sintomas mais marcantes. Muitos descrevem como uma fadiga que não passa, mesmo após descanso, e que interfere em tarefas simples, como subir alguns degraus ou até conversar."

"Eu não conseguia tomar banho quase sozinha que eu me cansava muito. Tirar as roupas assim, ficar movimentando, sem lavar o cabelo sozinha."

- Relato de uma das pacientes entrevistadas pela pesquisa (Ipsos, 2024)4

Mas, assim que o tratamento é iniciado, mudanças positivas já podem ser vistas. "Quando o diagnóstico é feito e o tratamento começa, é comum ver o paciente voltar a trabalhar, estudar e aproveitar a vida. Mas isso exige acompanhamento contínuo e apoio psicológico, porque a vulnerabilidade e a preocupação com familiares não desaparecem, afinal, a doença é crônica e progressiva", explica Maria Cecília.

Tratamento e desigualdades no acesso

O tratamento varia conforme a gravidade e a forma da doença. Na variante obstrutiva, o risco de insuficiência cardíaca é maior e as diretrizes recomendam betabloqueadores ou bloqueadores de canais de cálcio como primeira linha5. Em casos mais graves, quando os tratamentos convencionais não funcionam, desde 2023 as diretrizes de tratamento recomendam um medicamento oral que atua diretamente no coração, ajudando a diminuir o bloqueio do fluxo sanguíneo e melhorando a capacidade de realizar atividades do dia a dia¹,². Antes, pacientes com sintomas graves precisavam passar por cirurgias complexas ou procedimentos invasivos, restritos a profissionais e centros especializados. Essas intervenções, embora eficazes em muitos casos, não estão livres de riscos: podem levar a complicações como bloqueio atrioventricular completo - muitas vezes exigindo marcapasso -, arritmias ventriculares, insuficiência mitral residual e necrose extensa após alcoolização septal¹. "Um estudo mostrou que esse novo medicamento reduziu drasticamente a necessidade desses procedimentos em 16 semanas", afirma Fernandes.

"Eu acho que falta, de verdade, mais divulgação sobre a doença em si. Porque a maioria das pessoas não conhecem, não sabe o que é. E aí é uma coisa que é difícil você falar sobre o problema, e como falar para as pessoas sem alarmar (...) eu acho que se divulgasse mais sobre a doença, tratamento, o que é, quais os problemas que ela pode trazer, eu acho que já ajudaria quem convive com isso, entendeu? Porque as pessoas já te olham diferente. A minha mãe acha que eu vou morrer a cada 10 minutos."

- Relato de um dos pacientes entrevistados pela pesquisa (Ipsos, 2024)4

Apesar dos avanços, os desafios no acesso ao tratamento em geral permanecem, sobretudo na rede pública. "Para melhorar o rastreamento e o diagnóstico no Brasil, é essencial implementar uma linha de cuidado específica para a CMHo, com diretrizes clínicas no SUS, capacitação de profissionais e ampliação do acesso a exames e programas de rastreamento familiar", avalia Iara Machado, presidente da Associação Brasileira de Apoio à Família com Hipertensão Pulmonar e Doenças Correlatas (ABRAF).

Nesse cenário, associações desempenham papel fundamental no apoio e na visibilidade da CMHo. Antoine Daher, fundador e presidente da Casa Hunter, lembra que "o atraso no diagnóstico e o acesso restrito a centros especializados são desafios constantes, mas iniciativas como o Day Hunter oferecem atendimento multidisciplinar e escuta qualificada."

Ainda: pesquisas da Casa Hunter e da Febrararas mostram que 91% dos cuidadores de doenças raras são mulheres e quase metade precisa abandonar o emprego³, o que destaca ainda mais os desafios que os pacientes e toda sua rede de apoio enfrentam. Para Andrea Bento, Especialista em Mobilização Social no Grupo de Advocacy em Cardiovascular (GAC), "é fundamental que o paciente conheça sinais de alerta, opções de tratamento e tenha acesso a exames e especialistas."

Em resumo, os desafios são grandes, mas, com mais informação, acesso e apoio, pacientes com CMHo podem ter uma vida mais tranquila, controlada e com menos limitações.

Histórias reais acendem alerta importante

O zagueiro Serginho, do São Caetano, morreu em campo em 2004; o triatleta João Paulo Diniz faleceu em 2022; o jogador de futebol dinamarquês Christian Eriksen também teve uma parada cardíaca durante uma partida de futebol em 2020. Mais recentemente, João Gabriel Hofstatter De Lamar, de 20 anos, morreu durante uma corrida em Porto Alegre, o que motivou a criação da ONG Corre com o Coração. Todos eles tinham cardiomiopatia hipertrófica obstrutiva.

Mariana Pieri, namorada de João Gabriel e fundadora da ONG, conta que a doença só foi descoberta na autópsia. "O João nunca tinha apresentado nenhum sintoma. Era atleta, corria toda semana, tinha feito eletro e ecocardiograma em 2019 e não apareceu nada. Então a gente pensa: menino saudável, pratica esporte, não tem histórico, não precisa se preocupar. Mas precisa, sim", diz.

Segundo ela, a ONG criada em nome dele tem o objetivo de conscientizar sobre a importância do acompanhamento médico, mesmo em jovens sem sinais aparentes. "A miocardiopatia hipertrófica pode ser silenciosa. Não é parar de praticar esporte, de jeito nenhum, mas fazer exames e saber como está o corpo antes de se expor a treinos intensos. Se a gente conseguir salvar uma vida, já estaremos cumprindo o legado do João Gabriel", completa.

Referências

1) Sociedade Brasileira de Cardiologia. Diretriz sobre Diagnóstico e Tratamento da Cardiomiopatia Hipertrófica - Arq. Bras. Cardiol. 2024
2) Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Registro do medicamento CAMZYOS (mavacamten). 2023.
3) Casa Hunter; Febrararas. Perfil dos cuidadores de pacientes com doenças raras no Brasil. 2024.
4) Pesquisa qualitativa realizada pela Ipsos e encomendada por Bristol Myers Squibb. As 20 entrevistas foram realizadas via plataforma online entre novembro e dezembro de 2024, com pacientes diagnosticados com Cardiomiopatia Hipertrófica Obstrutiva.
5) Sociedade Brasileira de Cardiologia. Diretriz Brasileira de Cardiomiopatia Hipertrófica 2024 - Tratamento Farmacológico. Arq Bras Cardiol. 2024.
6) Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Hipertrofia Cardíaca (ABRAF). Relatório Patient Journey - CMHO. 2024.
7) IAC - Instituto Amor e Carinho