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DINO - 20 mai, 2015) - Michelle Amaral, De São Paulo
O McDonald´s, maior rede de fast food do mundo, utiliza estratégias agressivas de evasão fiscal em seus principais mercados, aponta o relatório "Golden Dodges (Desvios Dourados): Como o McDonald"s evita pagar sua quota tributária", publicado nesta terça-feira (19) por uma coalizão de sindicatos mundiais.
De acordo com o documento, aproveitando-se de lacunas fiscais corporativas, o McDonald´s deixou de pagar 1,8 bilhão de dólares de 2009 a 2013 ? entre eles, 1 bilhão de euros na Europa e 497 milhões de dólares australianos na Austrália.
No caso europeu, o Golden Dodges explica que o McDonald´s realizou uma reestruturação em suas atividades comerciais, em 2009, logo após uma mudança na política fiscal de Luxemburgo, que permitiu às empresas se beneficiar de uma redução significativa no imposto obtido da propriedade intelectual. O McDonald´s estabeleceu uma empresa de propriedade intelectual no país, para onde deslocou seu domicílio fiscal europeu, e abriu uma sucursal na Suíça, transferindo sua sede de Londres para Genebra.
Segundo o Golden Dodges, a McD Europe Franchising, criada pelo McDonald´s em Luxemburgo, teve uma receita acumula de 3,7 bilhões de euros em 4 anos, apesar de contar apenas com 13 funcionários e ter pago somente 16 milhões de euros em impostos no período. Os sindicatos denunciaram à União Europeia que esta receita provém do desvio de recursos das franquias do McDonald´s de outros países do continente e o caso está sendo investigado.
Já na Austrália, o repasse foi feito a uma subsidiária em Singapura, a McD Asia Pacif, LLC.
Manobras
A rede de fast food usa o modelo de franquias (mais de 80% dos estabelecimentos) e gera a maior parte de sua receita com o pagamento de royalties ao invés de operações comerciais diretas das lojas. Com isso, aponta o Golden Dodges, a rede consegue transferir esses royalties a filiais extraterritoriais [offshore] situadas em paraísos fiscais. O relatório denuncia que o McDonald´s conta com 42 filiais e sucursais em paraísos fiscais de todo o mundo, das quais 31 não aparecem em seu informe anual de 2014.
Além disso, mantém grandes fundos de caixas nestes locais. Em Luxemburgo, o Golden Dodges afirma que o McDonald´s tem mais de 1,9 bilhão de dólares.
As manobras de evasão fiscal do McDonald´s tem atraído a atenção de autoridades fiscais ao redor do mundo. Conforme o relatório, em pelo menos seis países a rede de fast food é alvo de investigação desde 2005.
Tendência global
O Golden Dodges, no entanto, alerta que a prática não é exclusiva do McDonald´s, mas uma tendência entre as grandes transnacionais, que utilizam os paraísos fiscais e os métodos de transferência de lucros para evitar o pagamento de impostos. Segundo o documento "War on Want, Everything you need know about tax", 32 trilhões de dólares estão em paraísos fiscais.
De acordo com o documento, a medida que se revelam os escândalos fiscais corporativos, cresce o interesse pelas práticas de evasão fiscal realizadas por empresas transnacionais. Em março deste ano, uma Comissão Independente para a Reforma da Tributação Empresarial Internacional (ICRICT, em inglês) foi criada para recomendar modificações no sistema fiscal mundial. As regras que determinam as taxas sobre as empresas transnacionais foram escritas há mais de 80 anos.
As entidades que redigiram o Golden Dodges - a Internacional de Serviços Públicos (ISP), a União Internacional de Trabalhadores da Alimentação (UITA) e o Sindicato Internacional de Empregados de Serviços (SIES) - pedem que os governos ao redor do mundo investiguem mais profundamente os acordos fiscais do McDonald´s e compartilhem as informações obtidas. Pedem, ainda, mais condições para que os inspetores das agências fiscais tenham recursos para recuperar os impostos não pagos pelas empresas.
No comunicado à imprensa, a secretária-geral da ISP, Rosa Pavanelli, disse que "não há desculpas para os governos realizarem cortes em serviços públicos, como saúde e educação, quando eles próprios deixam empresas como o McDonald´s mandarem bilhões de dólares em impostos para paraísos fiscais".
O McDonald´s
Além de ser a maior rede de fast food do mundo, com 36 mil lanchonetes e 69 milhões de clientes por dia, o McDonald´s é o maior franqueador mundial. Em 2014, arrecadou 87,8 bilhões de dólares em vendas em todo o sistema.
No entanto, a transnacional repetidamente tem sido denunciada por práticas ilegais que visam aumentar seu lucro em detrimento dos trabalhadores e das leis dos países onde opera. A evasão fiscal soma-se ao pagamento de salários rebaixados, sobrecarga de trabalho para os empregados, não pagamento dos direitos trabalhistas básicos, entre outros.
Recentemente, uma série de manifestações ocorreu em diversas partes do mundo para denunciar as irregularidades cometidas pelo McDonald´s. Nos Estados Unidos, trabalhadores pediram uma remuneração de, no mínimo, 15 dólares por hora.
Já no Brasil, as mobilizações tiveram como objetivo "alertar a população sobre a falta de respeito, recorrente e contínua, aos direitos humanos dos trabalhadores da rede em toda parte do mundo". O início da série de protestos no país ocorreu no dia 24 de fevereiro deste ano, com o lançamento da campanha "Sem Direitos não é Legal". Os sindicatos do setor ingressaram com uma ação judicial contra o McDonald´s pela prática de "dumping social", por desrespeitar as leis trabalhistas para reduzir custos e oferecer preços mais atrativos que os da concorrência, e pediram que a rede seja impedida de abrir mais lojas no país enquanto persistirem as irregularidades.
A jornada de trabalho imposta pelo McDonald´s a seus trabalhadores, conhecida como móvel e variável, tem sido também alvo de batalhas judiciais. Em 2013, o Ministério Público do Trabalho (MPT) de Pernambuco conseguiu, através de uma Ação Civil Pública, uma determinação judicial para o fim deste tipo de jornada de trabalho. Contudo, os sindicatos denunciam que a rede de fast food ainda não extinguiu tal prática.
No Reino Unido, a jornada de trabalho imposta pelo McDonald´s também é questionada. Lá a transnacional estabelece "contratos de zero horas", que deixam os trabalhadores sem nenhuma garantia de ter um trabalho habitual ou receitas estáveis, exigindo que permaneçam disponíveis para trabalhar a todo momento. Em junho de 2014, o governo do Reino Unido concluiu que havia provas contundentes de que estes contratos eram objeto de abuso.