Releases 27/10/2025 - 14:11

O futuro do GLP no Brasil: segurança, confiança e impacto das mudanças regulatórias


Pesquisa nacional revela: brasileiros querem preservar o modelo atual de abastecimento e rejeitam mudanças sem garantias seguras e sólidas.

Com presença em todos os municípios do Brasil e utilizado por 91% dos lares, o Gás Liquefeito de Petróleo (GLP), mais conhecido como gás de cozinha, se consolidou como um insumo essencial para a rotina dos brasileiros, uma energia relevante para o combate à pobreza energética no País. Todos os dias, 66 milhões de famílias utilizam o gás de botijão para preparar refeições, aquecer a água, garantir atividades básicas e dignas de conforto e bem-estar.

Trata-se de um dos pilares da matriz energética nacional: em 2024, o País consumiu 7,6 milhões de toneladas de GLP, consolidando-se como o sexto maior mercado residencial do mundo. Esse alcance só é possível graças a uma cadeia madura e eficiente, composta por distribuidoras, revendedores autorizados e prestadores de serviço que, juntos, asseguram a entrega porta a porta de 13 botijões de 13kg por segundo, em todo o território nacional. Ao todo, o setor mantém 140 milhões de cilindros em circulação e gera mais de 330 mil empregos diretos e indiretos.

Um mercado reconhecido pela segurança

O Brasil construiu um dos sistemas de distribuição de GLP mais seguros e eficientes do mundo. Cada botijão traz em alto-relevo a marca da distribuidora responsável, o que garante monitoramento, responsabilidade civil e criminal, além de assegurar a manutenção e requalificação periódica dos recipientes.

Para o presidente do Sindigás, Sergio Bandeira de Mello, o modelo é resultado de décadas de aprimoramento. "O sistema brasileiro combina portabilidade do botijão, rede ampla de revendas autorizadas e responsabilização direta da distribuidora pela marca. É um modelo altamente estruturado e regulado, baseado em enchimento industrial padronizado e plantas automatizadas, o que garante segurança, qualidade e eficiência em todo o território nacional", explica.

Com origem controlada, enchimento industrial e fiscalização permanente, o consumidor sabe de quem está comprando, quanto está adquirindo e a quem recorrer em caso de imprevistos. Transparência que se traduz em credibilidade, conformidade técnica e em um sistema que não figura entre as 50 maiores reclamações dos Procons estaduais.

O debate sobre as possíveis mudanças propostas pela ANP

Esse modelo logístico tão eficiente do mercado atual de GLP está agora sob análise e corre sérios riscos de sofrer mudanças. A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) conduz uma Análise de Impacto Regulatório (AIR) que avalia mudanças estruturais no setor. Entre as propostas, estão a possibilidade de enchimento de botijões de diferentes marcas por qualquer distribuidora, apoiada em um rastreamento digital ainda inexistente e não testado.

Além disso, há a possibilidade de autorização para enchimento fracionado e remoto, inclusive em áreas urbanas. "Estamos falando de um produto inflamável. Não dá para imaginar o enchimento sendo feito em áreas urbanas, perto de escolas ou em supermercados. Hoje isso é feito em grandes bases industriais, com estrutura e equipes de emergência. Improvisar seria inseguro e, no fim, até mais caro. Além de acidentes, também se corre o risco de trazer para o mercado de GLP problemas que não temos, mas que existem no mercado de combustíveis, como mostrado pela recente Operação Carbono Oculto. A ANP não consegue fiscalizar e reprimir o crime no País todo", completa Bandeira de Mello, lembrando que a própria agência não dispõe hoje de estrutura ou verba suficientes para coibir as fraudes já existentes no mercado de combustíveis líquidos.

A preocupação tem fundamento: a Operação Carbono Oculto, conduzida pelo Ministério da Justiça, revelou que o crime organizado movimentou R$ 42 bilhões em esquemas fraudulentos nos últimos cinco anos, envolvendo adulterações e desvios em combustíveis. Para o setor, sem a marca gravada nos botijões e o enchimento fracionado, fraudes semelhantes podem atingir também o GLP. "A marca gravada em cada botijão não é à toa. Ela significa que as empresas assumem responsabilidade pela segurança e pela requalificação dos cilindros. Se esse vínculo for quebrado, como propõe a ANP, o botijão passa a ser de qualquer um. Além disso, nesse cenário, quem investirá bilhões na compra e manutenção de milhões de novos recipientes necessários para o programa Gás do Povo, por exemplo? Sem essa garantia, os investimentos ficam inviáveis e o setor viverá uma enorme insegurança jurídica. O Brasil tem hoje duas políticas que caminham em sentidos opostos e precisa fazer uma escolha", afirma o executivo.

Para o Sindigás, as medidas trariam riscos diretos à segurança, à qualidade e à fiscalização, especialmente porque mais de 80 milhões de botijões fabricados antes de 2005 não possuem número de série. "A ANP analisa mudanças que podem fragilizar mecanismos de controle e responsabilidade do setor", alerta Bandeira de Mello. "Experiências no México e no Paraguai mostram que o afrouxamento das regras levou ao aumento de acidentes, fraudes e à perda de controle sobre o parque de botijões. Flexibilizar é colocar em risco a população."

Debate ocorre em momento de expansão da demanda por conta do programa Gás do Povo

O executivo destaca que o debate ocorre em um momento importante de expansão da demanda, impulsionado pelo programa Gás do Povo, lançado recentemente pelo Governo Federal, que prevê o fornecimento gratuito de cargas de gás de 13 kg a 15,5 milhões de famílias em vulnerabilidade — um acréscimo de 25 milhões a 30 milhões de cargas anuais.

A iniciativa visa ao combate da pobreza energética, levando uma energia mais limpa e segura que outros combustíveis, como o carvão e a lenha, ainda presentes em 23% dos lares brasileiros, segundo o Balanço Energético Nacional 2025 elaborado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Energética (EPE). "Qualquer enfraquecimento do monitoramento dos botijões ou da responsabilidade pode afetar justamente as populações mais dependentes do GLP, prejudicando o acesso delas à dignidade energética, uma maior qualidade de vida e saúde", afirma.

Pesquisa aponta que nove em cada dez brasileiros veem a marca no botijão como garantia de segurança

A preocupação com a segurança não se limita ao setor. Ela também está presente entre os consumidores, como mostra uma pesquisa realizada pelo Instituto Locomotiva em junho de 2025. O levantamento, que ouviu 1.500 pessoas em todas as regiões do País, revela que a maioria dos brasileiros vê riscos concretos nas mudanças em discussão e defende a manutenção das regras atuais.

"A população sabe que um botijão malconservado pode colocar vidas em risco. Sem a marca gravada, fica difícil saber a procedência e quem se responsabiliza por ele. Além disso, a chance de adulteração ou de receber menos gás do que comprou é muito grande. A pesquisa mostrou que o brasileiro valoriza políticas públicas que ampliem o acesso ao gás, sim, mas sem abrir mão da segurança", explica Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva.

Os números reforçam a percepção:

. Segurança:

94% priorizam segurança acima do preço;

93% veem risco de adulteração no gás fracionado;

92% temem vazamentos e 90% apontam risco de explosão;

82% preferem pagar mais caro para manter a integridade do produto.

. Confiança na marca e na qualidade:

97% defendem que a marca do botijão continue responsável pela qualidade;

94% consideram essencial que o nome da empresa esteja gravado em alto-relevo;

94% avaliam que haveria risco relevante em não ter a quem recorrer em caso de problemas.

. Fiscalização e responsabilidade:

93% enxergam riscos à fiscalização se o botijão não for vendido cheio e lacrado;

87% afirmam que seria difícil garantir a quantidade correta de gás no fracionamento;

83% apoiam a exigência de que apenas a empresa dona da marca possa realizar o enchimento.

"Mesmo sendo o sexto maior mercado residencial do mundo, com 140 milhões de botijões em circulação, o setor é um dos mais bem avaliados do País. Esse nível de organização é fruto de décadas de investimento em tecnologia, qualidade e conformidade regulatória", reforça Bandeira de Mello.

Um patrimônio a ser preservado

Mais do que um produto essencial, o botijão de GLP é um símbolo de acesso, conveniência e confiança energética. "O GLP continuará tendo papel central na transição energética, porque não há solução única capaz de atender a todas as realidades", afirma o presidente do Sindigás. "Na América Latina, 70 milhões de pessoas ainda cozinham sem segurança. Migrar para o GLP é um passo concreto para reduzir impactos ambientais e melhorar a saúde pública." Segundo ele, o Brasil se destaca pela capilaridade, qualidade do serviço e estrutura regulatória consolidada — ativos que precisam ser preservados.

O presidente também acredita que a previsibilidade regulatória é indispensável para garantir novos investimentos em infraestrutura, armazenamento e redes de distribuição, assegurando eficiência, qualidade e competitividade, mesmo com o aumento da demanda. "Estabilidade e regras claras são condições essenciais para o futuro do setor. Só assim poderemos continuar ampliando o acesso, inovando em tecnologia e assegurando que o GLP siga cumprindo seu papel social e energético no Brasil", conclui.