Releases 16/06/2015 - 16:59

O papel do advogado torna-se cada vez mais essencial na luta contra o doping


Piracicaba - SP--(DINO - 16 jun, 2015) - Muito se tem falado sobre doping nos últimos tempos. Atletas de ponta punidos de forma rígida e carreiras encerradas por conta do uso de substâncias proibidas tomam conta, cada vez mais, dos noticiários esportivos.
O esporte tem mudado de uns tempos para cá, virou negócio e, por conta dessa modificação gritante no modo de se ver as competições, os altos investimentos passaram a ser rotina.

Atletas que antes não tinham apoio se veem cada vez mais absorvidos com a ideia de ganhar a qualquer custo. Anos de luta sem resultados e em um momento as coisas podem simplesmente mudar. Em desabafo feito por meio de um livro polêmico chamado "A corrida secreta de Lance Armstrong", o ex-ciclista Tyler Hamilton ousou dizer "Eis um número interessante: mil dias. (..) Conversar com outros ciclistas dessa era e ler suas histórias, parece ser um padrão: aqueles de nós que usaram doping, na maioria das vezes, começaram a partir do terceiro ano. Primeiro ano, recém-profissional, animado por estar lá, o calouro está cheio de esperança. Segundo ano, cai-se na real. Terceiro ano, clareza ? a encruzilhada. Sim ou não. Dentro ou fora. Todo mundo tem seus mil dias: todo mundo tem sua escolha. "

Detalhando sua vida como atleta o mesmo conta os desafios, as angústias, as tristezas, as lutas incessantes e demonstra ao mundo que, o ser humano tem seus limites, seja para desistir, seja para ir em frente. E o preço, no entanto, pode ser alto, pode, inclusive, lhe custar a própria vida. A corrida por melhores resultados vislumbra qualquer atleta, e, encantados com as possibilidades muitos deles se perdem seja por ganância, seja por sua própria origem humilde e inocência. O uso de substâncias proibidas começa, então, a fazer parte da rotina.

Acompanhando desde 2008 inúmeros casos em diversos Tribunais Desportivos, tive a oportunidade de conhecer realidades tristes, esforços descomunais, lutas incessantes, técnicos vislumbrados, patrocinadores vorazes e médicos inescrupulosos. O atleta, envolto a um staff com o único objetivo de ganhar em performance começa a jogar com sua própria saúde para obter as medalhas e o reconhecimento tão almejado. Uma ilusão, que as políticas antidoping no mundo, capitaneadas pela WADA (Agência Mundial Antidoping), procuram afastar a qualquer custo.

E muito se tem feito desde a criação da entidade, sendo que, a mais recente novidade na luta por um esporte limpo, é, por certo, o Novo Código Mundial Antidoping que entrou em vigor em 01 de janeiro de 2015. O que sempre me chama a atenção, no entanto, são os processos jurídicos desportivos que envolvem essa matéria de tamanha relevância aos atletas. Um processo de doping com uma punição mínima base de 2 anos até então, 4 anos pelo Novo Código, pode acabar com sonhos, projetos, carreiras e mesmo o sustento de muitos atletas que, sem uma defesa adequada, pode ver suas chances suprimidas em um curto espaço de tempo.

Tenho visto a evolução dos Tribunais e a matéria muitas vezes não se mostra de forma clara aos que neles atuam, sendo certo que campanhas, cursos e outras formas de disseminação de tal conhecimento tem se mostrado extremamente necessárias visando a profissionalização dos que atuam em todas as fases do processo, especialmente aos auditores que deverão julgar e dar um destino à carreira de muitos profissionais.

De fundamental importância se mostra, pois, a atuação do advogado nesse contexto. A busca pela verdade real e a luta pela diminuição das penalidades ou mesmo uma absolvição têm que ser vistas não apenas como um desafio, mas essencialmente como uma forma de mostrar ao sistema os verdadeiros culpados, aqueles profissionais que instigam, que fornecem suprimentos proibidos, que atuam de forma antiética e que manipulam os atletas com base na confiança que estes lhe depositam, salvo, obviamente nos casos onde o próprio atleta assume a autoria da infração devendo, dessa forma e para seu próprio bem, ser devidamente penalizado.
E uma atuação jurídica competente e detalhista poderá ser a diferença entre os que se vão e os que permanecem de forma digna dentro dos campos e quadras do país e do mundo.

Na luta por um esporte limpo, a atuação do jurista deve ser consciente e levar em consideração inúmeros fatores, dentre eles a modalidade em discussão e especialmente as peculiaridades de regimentos e normas internacionais.
Mecanismos como os contidos nas próprias Regras Oficiais aplicadas ao Atletismo, por exemplo, permitem uma redução e flexibilização crucial na pena dos atletas se bem apresentado e fundamentado juridicamente.

A assistência substancial, qual seja, a previsão de colaboração às autoridades competentes na descoberta de esquemas de posse, tráfico e administração de substâncias proibidas, muitas vezes desconhecidas, tem sido instrumento pouco usado, sendo certo que, em muitos casos, o atleta acaba assumindo ele mesmo a autoria da infração sem sequer apresentar a verdade aos tribunais. As possíveis isenções de uso terapêutico e até mesmo questões procedimentais previstas podem também ser questionadas.

A prova em um processo de doping é de suma importância. A verificação de questões formais como documentos laboratoriais e procedimentos, o histórico médico e exemplar do atleta, a forma e quantidade de substância ingerida, o histórico de resultados do atleta e mesmo do staff que o acompanha dentre outras peculiaridades de cada atleta são de extrema valia para a apreciação adequada do caso concreto por aqueles que terão em suas mãos a vida e sonhos de muitos deles.

Portanto, a busca por soluções plausíveis e os enquadramentos jurídicos pertinentes são essenciais para se minimizar as penalidades e mesmo lutar por uma absolvição dentro dos Tribunais o que, daqui pra frente, com o aumento significativo da fiscalização e atuação incisiva da ABCD (Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem) no país, será de importância ímpar na vida de um atleta.

*Fernanda Bazanelli Bini é advogada do escritório BINI Advogados, pós-graduada em Direito Desportivo, procuradora do STJD do Futebol e da Comissão Disciplinar Permanente do Tribunal Disciplinar do Comitê Paralímpico Brasileiro, bem como integrante de diversos tribunais desportivos nacionais.