Orlando, Florida--(
DINO - 28 jan, 2016) - * Claudemir Oliveira, Phd
Há anos venho estudando a arte na entrega da excelência em serviços. Clientologia pode ser definida como o estudo, a ciência de criar, manter e fidelizar o cliente. Vivendo nos EUA desde o ano 2000, logo me acostumei com a questão da gorjeta, instituída principalmente pelos restaurantes.
De cara, sem rodeios, afirmo que a indústria da gorjeta é uma consequência da incompetência de quem a criou. Esta é a verdade que ninguém quer ouvir, principalmente alguns sindicatos e "empresários" que defendem esta prática. Ao final deste artigo, vocês vão perceber claramente que a crítica não é contra os profissionais, pelo contrário, os defendo, mas o sistema criado, decididamente, não é adequado quando se trata de atendimento ao cliente.
Vamos começar pela incompetência. Que história é essa que devemos dar a gorjeta porque o salário do "coitiadinho" é pouco e somente a gorjeta complementa seu salário real, ideal, etc? Isto é conversa de incompetente. Repito. Incompetente. Quer dizer então que o empregador está transferindo sua responsabilidade para o cliente sobre parte do pagamento do salário do colaborador? É isto mesmo? Sim, é isto mesmo! É até vergonhoso tratar um colaborador dessa forma. É mais ou menos assim: isso é o que tenho para te pagar e se vira aí para complementar o teu salário. Naturalmente que os que defendem o sistema vão afirmar que esta tática fará com que os colaboradores se dediquem mais, blá, blá, blá, blá. Veja o exemplo abaixo e verão que, na prática, não funciona tão bem assim. Admitam logo que não têm competência para dizer aos clientes que o produto ou serviço tem um valor maior e diferenciado. Você, empresário desse setor, é melhor do que imagina. Não tenha medo. Não divida sua responsabilidade com o cliente de pagar um colaborador. É mais feio do que você imagina. Era só o que me faltava chamar de "coitadinhos" profissionais excepcionais.
Vamos a um segundo argumento dos motivos que dentro da clientologia é um desserviço a tal da gorjeta. Vamos imaginar que um garçom atende todos os dias o João, a Maria, o Roberto e a Gabriela. O primeiro costuma dar 10% de gorjeta; o segundo, 15%; o terceiro, 20%, e a Gabriela dá 25% de gorgeta. Como esse "coitadinho" vai reagir em termos de atendimento a estes 4 clientes? Sim, o correto seria atender todos de forma excepcional, mas é isto que ocorre? Óbvio que não. Sabe por que? Porque o incompetente do dono do negócio resolveu deixar o salário de seu colaborador nas mãos das pessoas. E o serviço desse profissional é afetado? Lógico que sim. Antes que alguém saia ai gritando que estou falando bobagem, lembre-se que estou falando de uma forma bem generalizada, num artigo curto onde não podemos explorar todas as situações. Sim, para tudo, há exceção.
Um dos sinônimos da palavra gorjeta é propina, palavra mais usada em espanhol. Mas se formos analisar a situação de forma bem mais profunda, a gorjeta acaba tendo um pouco essa conotação negativa. A relação seria mais ou menos assim. Garçom: ou você me dá a gorjeta ou o serviço será bem ruim. Cliente: ou você me dá um serviço maravilhoso ou não te darei gorjeta. Outro dia, vi um garçom sair, literalmente, no tapa com um cliente aqui nos EUA porque este não quis deixar a gorjeta. Olha o vexame! Detalhe: quem é o incompetente nesta história toda? O principal é, sim, o dono do negócio. Simples assim.
O que me preoucupa em termos de serviços é que esta questão da gorjeta está ultrapassando fronteiras. Restaurante é o mais normal, mas tenho visto em pet shop, táxis, barbearia, entre outros. E se eu não der a gorjeta vão olhar meu cãozinho de forma diferente? E o barbeiro com aquela navalha? O que é bom para ele? 10%, 15%, 20%? Se der 20% ele deixa as duas orelhas intactas? Estou apenas dando humor ao texto, mas falando de algo sério do ponto de vista da clientologia, da excelência em serviços.
Existe uma saída que somente os competentes conseguem enxergar. Coloque no preço a "gorjeta". Ora bolas, se eu vou almoçar e o almoço custa USD 20,00 e o dono do negócio e os colaboradores acreditam que merecem 25%, que coloquem o valor do almoço USD 25,00. Eu faria ainda mais. Avisaria aos clientes que eles já pagam muito bem pelo almoço e que os garçons estão recebendo um salário justo pelo serviço. Este tipo de ação evita a situação colocada no quarto parágrafo acima sobre os clientes João, Maria, Roberto e Gabriela.
Existem outras áreas de negócios que eu simplesmente NÃO entendo. No Brasil, por exemplo, contador cobrar 13 salário do cliente é surreal. Por que já não coloca na mensalidade? Detalhe, a empresa merece o valor total, portanto, o problema é a estratégia. Fica feio. Eu pagando 13 salário de outra empresa? Pessoal, numa boa, tolerância zero. Já imaginou, no final do ano, o Seeds of Dreams Institute mandando um boleto para todos os clientes com o percentual do décimo terceiro da minha empresa? Putz, sabe quando isto vai ocorrer? NUNCA, NUNCA, NUNCA? tenho pesadelo só em escrever isso tamanha a incompetência que seria. Meus amigos contadores, não fiquem tristes comigo. Note que não estou querendo diminuir o que vocês ganham. Estou dando uma consultoria de graça (poderia cobrar) para que alguém ai leve isso para o sindicato de vocês. Mudar faz sentido até do ponto de vista psicológico. O teu cliente gosta de você durante 11 meses e no Natal ele começa a desconfiar que talvez você seja incompetente por não saber cobrar de uma forma que faça sentido.
Portanto, minha visão em nenhum momento é para garçons ou profissionais ganharem miséria e sobreviverem de gorjetas. Não é isso. Defendo o contrário. Quem me conhece sabe que sou bem generoso nas gorjetas, porque não posso prejudicar estes profissionais. Meu cartão vermelho é para a liderança. Defendo competência em gestão de quem está nestes negócios. Já existem empresas nesse caminho em outras áreas. Os supermercados Publix, aqui nos EUA, tem os colaboradores sorridentes que nos levam as compras até o carro e quando ousamos dar gorjeta eles dizem algo mais ou menos assim: "muito obrigado mas o senhor já pagou por esse serviço. Temos os melhores salários do setor". Um banho de competência. Detalhe: o Publix cobra, em geral, de 25% a 35% a mais pelos produtos quando comparados com outras redes de supermercados. E eu e minha esposa continuamos comprando lá. É tão difícil entender essa matemática de valor entre o que se paga e o que se recebe? Telerância zero e clientologia neles!
P.S. se os argumentos acima não forem suficientes, um último recado a quem brinca de empresário. Pelo que eu saiba, o cliente não é seu sócio na questão salarial de seus colaboradores. Tome a rédea do seu negócio, cobre mais (se tiver competência) e o cliente paga a você e você paga ao seu colaborador. Preciso desenhar?
* Claudemir Oliveira, PhD, é jornalista, tem pós graduação em Marketing e Comunicação Empresaria, no Brasil. Nos EUA, tem mestrado e doutorado em Psicologia, com foco em Psicologia Positiva. É presidente do Seeds of Dreams Institute
Website:
http://www.seedsofdreams.org/